Mundo azul

               A menina chegou da escola, como costumeiramente acontecia, à procura de alguma coisa. Nunca soube revelar à mãe o motivo de sua ansiosa busca imaterial, além disso, numa casa de poucos cômodos e de móveis invisíveis seria quase impossível perder algo valioso ou de tanto interesse. Fome não poderia ser porque a ajuda que recebia das pessoas ao seu redor era vantajosa demais para ainda sobrar espaço no seu corpo esguio e grácil.

               Dona Safira já sabia do que se tratava, pois, coração de mãe não se engana. Se ela pudesse daria à filha um mundo todo azul, uma casa com bastante recheio de amor e cobertura de proteção e paz, muitos parques de diversões para distrair uma mente com tantas ocupações, e amigos infinitos para minimizar o sofrimento pelos traumas do prefácio de sua história – perder um pai antes de ser concebida tornou a criança curva como uma interrogação, afinal o pai sumira apenas dos limites geográficos desta família para ocupar outro território familiar.  Fazer o quê? Tentar ajudar a filha a adaptar-se ao mundo cor de rosa em que nasceu, pareceu-lhe a melhor solução:

               – O que procuras, filha? Não vês que tudo do que precisas está diante de teus olhos?

               Por poucos instantes, a menina aterrissou: focou o olhar no vestidinho rosa que sempre colocara ao chegar da escola, na sandalinha rosa que ganhou da vó, no carrinho rosa que encontrou na rua, nas paredes rosas de um cenário retraído, que, aos poucos foi mudando de cor até desbotar-se inteiramente nos seus olhos, revelando sutilmente fragmento do seu mundo interior:

               – Mamãe, se eu pudesse, seria uma cor, seria azul.

A mulher sabia que se a filha fosse o azul não nasceria de uma combinação nem do resultado de um acidente de cores. Entendeu que no coração da criança havia a busca por redenção e um lápis de cor querendo pintar um mundo diferente daquele que só os adultos sabem pintar.

Então, presenteou a filha com uma paleta de cores. E, na impressionante obra que a menina criou, havia um mundo bem azulzinho com um céu cheio de cisnes voando em forma de “v”, nenhum saía da vista do outro por sobrevivência e amor! Com o “V” escreveu VENCER as dificuldades da vida sem precisar de um herói, somente a Supermãe para preencher um coração pueril com muitas alegrias e substituir “aquele melhor amigo” que poderia buscá-la ao menos uma vez na escola.

Elciane de Lima Paulino

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