Elciane de Lima Paulino
Não era a escola dos meus sonhos, mas cumpria uma importante função – e que função! A sala estava quente como nunca; os ventiladores não funcionavam… Mas nordestino não pode reclamar do tom abrasivo do tempo, já que este sempre pode surpreender. Ao menos a sala era ampla para a quantidade de alunos, isso minimizava o “efeito estufa” daquele início de manhã. Uma cadeira velha e vazia identificava o atraso de uma boa menina que raramente faltara às lições. Maria era disciplinada, esforçava-se como uma formiguinha carregando sobrepesos para compensar os prejuízos causados pelo complexo sistema de organização social – uma estrutura para se colocar defeitos, porém convido-o a prestar atenção na lição de hoje. Para isso, retomarei um acontecimento do dia anterior.
Era meio dia, os raios solares pareciam contornar as rachaduras do chão, quando ouvi da cozinha de minha casa uma voz feminina chamando ao portão.
– Pois não…
– Oh, minha filha, você não tem uma roupa perdida que não sirva mais? – Havia uma sacola de roupas retiradas do armário por não me servirem mais, dentre elas, uma calça jeans esgarçada, castigada pelo sol, pelo tempo e pelos meus olhos ao julgá-la velha demais para merecer as prateleiras de um guarda-roupa.
– Tenho uma sacola de roupas, mas a senhora verá que algumas não lhe servirão, então peço que as retire e lhes dê o destino que merecem.
A senhora agradeceu feliz e retirou-se carregando o volume sobre a cabeça.
Hoje, pelas repetidas vezes com que ocorre, esse acontecimento banal, naturalmente, estaria apagado dessas linhas se os olhos de Maria fossem tão criteriosos como os meus. Naquela manhã, a menina entrou radiante na sala, os olhos traziam a diferença de um brilho a mais, e a sala inteira reparou no seu “bom dia”. Não resisti ao elogio:
– Como você está linda!
Ela fez trejeitos de quando ficamos sem jeito diante de um gracejo. O sorriso da menina desabrochou e junto a ele a lição do dia:
– É que estou de roupa nova!
Nesse momento, reparei a roupa que a menina vestia: uma blusa amarela, retirada da sacola que uma senhora recebera ao portão de minha casa no dia anterior, e uma calça jeans esgarçada, castigada pelo sol, pelo tempo e pelos meus olhos, que nunca mais foram os mesmos.
Difícil avaliar o impacto que essa menina provocou em meus conceitos ao entender que aquela calça ainda merecia uma prateleira e, mais que isso, serviria de inspiração para entender que professores também aprendem nobres lições naquela e noutras escolas que ainda não são as dos nossos sonhos.