Menina do interior

Elciane de Lima Paulino

– Vó, qual dessas estrelinhas é a senhora? Consegue ver daí que o mundo parou e virou uma interrogação bem parecida comigo, desde que a senhora se foi? A única forma de explorá-lo, neste momento, é da brechinha da janela do nosso quarto. Estou confinada nos limites da nossa casa, onde há pouca comida, falta água constantemente e também não há muito o que conversar. Se a Terra parou por causa de um ser que nem se consegue enxergar a olho nu, por que a senhora não me responde? De toda ciência que disponho…, suas sábias palavras são uma revolução aqui dentro: “Quando o homem não encontra a solução para um problema, a chave da resposta está no Céu.” Na melhor das hipóteses, é por isso que os templos viviam lotados de homens que, embora lutassem por igualdade promovendo guerras e desamor, clamavam por vitória e salvação – paradoxo da humanidade. Na época da seca, por exemplo, não disputávamos com demasiado egoísmo por uma migalha de pão e depois estendíamos as mãos para o céu? Em tricas eleitorais, não promovíamos a discórdia para ter a sensação de controle nas mãos… e depois de vencer dávamos graças a quem? Não mascarávamos o preconceito em perfis sociais idealizados, mesmo sabendo que todos somos imagem e semelhança de Deus? Mas essas reflexões são frutos de sua arte no meu interior. Ajoelhada, para a última oração do dia, antes de dormir, pergunto-lhe: e, agora, como extrair um sorriso nas curvas da exclusão, um verso no redemoinho da fome, um alento na linha do desemprego, um abraço no pontilhismo da guerra, um amor no traço do preconceito, uma esperança no caos da pandemia, a cor dos seus olhos no brilho de uma estrela?

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